Órgão julgador: Turma de Recursos, convertendo-se a apelação, se já interposta, em recurso inominado.
Data do julgamento: 23 de junho de 2015
Ementa
RECURSO – Documento:7080839 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5003945-71.2022.8.24.0008/SC DESPACHO/DECISÃO Trata-se de recurso de apelação interposto por A. D. S. contra a sentença que, nos autos da ação ordinária proposta em face do Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Blumenau – SAMAE, julgou improcedente o pedido de condenação do demandado ao pagamento do adicional por serviço extraordinário, em razão da supressão do intervalo intrajornada, e os respectivos reflexos, observada a prescrição quinquenal. Com as contrarrazões os autos ascenderam a esta Superior Instância.
(TJSC; Processo nº 5003945-71.2022.8.24.0008; Recurso: recurso; Relator: ; Órgão julgador: Turma de Recursos, convertendo-se a apelação, se já interposta, em recurso inominado.; Data do Julgamento: 23 de junho de 2015)
Texto completo da decisão
Documento:7080839 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5003945-71.2022.8.24.0008/SC
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de recurso de apelação interposto por A. D. S. contra a sentença que, nos autos da ação ordinária proposta em face do Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Blumenau – SAMAE, julgou improcedente o pedido de condenação do demandado ao pagamento do adicional por serviço extraordinário, em razão da supressão do intervalo intrajornada, e os respectivos reflexos, observada a prescrição quinquenal.
Com as contrarrazões os autos ascenderam a esta Superior Instância.
É o relatório, decido.
Antes de adentrar no exame da quaestio, impende analisar, preliminarmente, a competência deste órgão julgador.
A Lei n. 12.153/2009, que instituiu os Juizados Especiais da Fazenda Pública estabelece em seu art. 2º, caput e § 4º:
Art. 2º É de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos.
§ 1º Não se incluem na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública:
I – as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos;
II – as causas sobre bens imóveis dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas;
III – as causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções disciplinares aplicadas a militares.
§ 2º Quando a pretensão versar sobre obrigações vincendas, para fins de competência do Juizado Especial, a soma de 12 (doze) parcelas vincendas e de eventuais parcelas vencidas não poderá exceder o valor referido no caput deste artigo.
[...]
§ 4º No foro onde estiver instalado Juizado Especial da Fazenda Pública, a sua competência é absoluta.
O Grupo de Câmaras de Direito Público, por sua vez, em sessão extraordinária realizada em 10/12/2014, aprovou, por unanimidade, as "Primeiras Conclusões Interpretativas sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública", publicadas no Diário da Justiça Eletrônico n. 2025, do dia 19/12/2014, no qual ficou estabelecido o seguinte:
1ª Conclusão:
A partir de 23 de junho de 2015, ex vi do art. 23 da Lei n. 12.153/2009, tem-se por incontroverso e indiscutível o funcionamento amplo e irrestrito das unidades dos Juizados Especiais da Fazenda Pública em Santa Catarina, de forma autônoma, onde instalado juizado especial fazendário, e concorrente com outra unidade jurisdicional em caso de inexistência do referido juizado especial fazendário.
A Lei n. 12.153, de 22 de dezembro de 2009, em seu art. 22, deixou assentado que “Os Juizados Especiais da Fazenda Pública serão instalados no prazo de até 2 (dois) anos da vigência desta Lei, podendo haver o aproveitamento total ou parcial das estruturas das atuais Varas da Fazenda Pública”, como ainda, que “Os Tribunais poderão limitar, por até 5 (cinco) anos, a partir da entrada em vigor desta Lei, a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, atendendo à necessidade da organização dos serviços judiciários e administrativos” (art.23).
A partir desses comandos legais e à vista também do prescrito nos arts. 24 e 25 da mesma Lei, o , já instalados os Juizados Especiais da Fazenda Pública, seja como unidade autônoma, no caso da Capital, seja como unidade integrada, hipótese viabilizada para o interior, juízo com competência simultânea, havia a indispensável necessidade do fiel cumprimento da Lei n. 12.153/2009.
De qualquer modo, como forma de evitar precipitações ou reconhecimento de nulidades prejudiciais à efetiva aplicação da Lei n. 12.153/2009, deve-se adotar como marco intransponível para a aplicação ampla e irrestrita desta Lei a data de 23-6-2015. Ainda que a Res. N. 18/2010 não tenha limitado a competência dos Juizados da Fazenda Pública, tal como facultado pelo art. 23 da lei regente, deve-se ter em vista a atual estrutura das unidades judiciárias, assim como as perspectivas de incremento decorrentes da adequação da competência nesse momento (o que não é de plano mensurável).
O fato é que a realidade se mostrou diversa, pois não houve por parte do Tribunal, em tempo e modo, a necessária disponibilização de estrutura que permitisse a aplicação ampla da Lei n. 12.153/2009, claudicando os juízos fazendários na própria adoção do rito especial, conferindo às demandas seguimento como se causa dos juizados especiais não se tratasse.
Essa percepção da realidade implica, necessariamente, no reconhecimento de que na prática a competência dos juizados especiais da fazenda pública se manteve limitada, à falta de estruturação compatível com a demanda a ser absorvida, circunstância a impor não se pronuncie qualquer nulidade processual pretérita.
2º Conclusão:
A competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, a teor do art. 2º caput e § 4º da Lei n. 12.153, de 22 de dezembro de 2009, é absoluta, cogente e inderrogável, e fixa-se, em regra, pelo valor da causa.
A competência, no Sistema dos Juizados Especiais, para as causas de até 60 salários mínimos, que envolvam a fazenda pública, por força de lei, é absoluta e inderrogável.
Portanto, cumpre aos juízes e tribunal lhe conferir aplicação efetiva, sob pena de nulidade.
Segundo o STJ, “o reconhecimento da incompetência absoluta enseja a nulidade dos atos decisórios, em face do disposto no art. 113, § 2º do CPC. Até porque, exatamente por ter o juízo se declarado absolutamente incompetente, não se justifica a prolação de sentença de extinção do processo sem resolução do mérito” (REsp n. 1.257.655).
2ª-A Conclusão:
A inobservância ou inaplicação do microssistema especial dos Juizados da Fazenda Pública, por magistrado com competência simultânea ou concorrente, não traduz nulidade, uma vez garantido com maior amplitude o direito das partes, impondo-se apenas a sujeição recursal a órgão diverso, qual seja, a Turma de Recursos, convertendo-se a apelação, se já interposta, em recurso inominado.
Tendo a Lei n. 12.153/2009 admitido, em seu art. 23, a limitação das matérias da competência dos juizados especiais da fazenda pública, por óbvia razão, se há compreender e ter por reforçado o ensinamento segundo o qual a adoção de rito processual mais amplo não implica em nulidade processual, senão apenas no direcionamento do recurso eventualmente interposto ao órgão revisor competente, no caso, a Turma de Recursos.
A sentença proferida no juízo comum, por autoridade com competência jurisdicional concorrente, dispensa o pronunciamento de nulidade, porquanto a partir do momento em que o Tribunal reconhece a sua incompetência revisora, a sentença convalesce como pronunciada no juizado especial e, como tal, o recurso interposto, então de apelação, se aproveita da fungibilidade, porque reiniciado o prazo de impugnação da sentença, cumprindo seja admitido, tempestivamente, como recurso inominado.
A autorização de remessa dos autos à Turma Recursal da Fazenda Pública pode ser extraída da própria dicção do art. 24 da Lei n. 12.153/2009, o qual determina que “não serão remetidas aos Juizados Especiais da Fazenda Pública as demandas ajuizadas até a data de sua instalação”. Mutatis mutandis, significa que após a instalação é decorrência lógica essa remessa dos autos.
Em pesquisa na jurisprudência pátria, percebe-se que o EM QUE SE PRETENDE RETIFICAÇÃO DE ASSENTOS FUNCIONAIS E PAGAMENTO DE DIFERENÇAS REMUNERATÓRIAS. NECESSIDADE DE PROVA DE MEDIANA COMPLEXIDADE, PASSÍVEL DE SER PRODUZIDA MEDIANTE O “EXAME TÉCNICO” A QUE ALUDE O ART. 10 DA LEI N. 12.153/2009. CONFLITO ACOLHIDO. FIXADA A COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL” (Conflito de Competência n. 2014.021890- 9, rel. Des. Alexandre D’Ivanenko) (grifou-se).
Pelas diretrizes traçadas pelo Grupo de Câmaras de Direito Público, é forçoso concluir que, a partir de 23 de junho de 2015, tornou-se obrigatória a adoção da competência absoluta e do procedimento especial previsto na Lei n. 12.153/2009, para as ações cujo valor da causa for inferior a 60 (sessenta) salários mínimos e que estejam em trâmite perante alguma das Comarcas que não contam com Juizado Especial da Fazenda Pública, uma vez que, nesta hipótese, tal se considera abrangido pela competência da vara encarregada pelo processamento dos feitos da Fazenda Pública.
Sendo assim, do presente reclamo esta Corte de Justiça não pode conhecer, porquanto o valor dado à causa (R$ 1.000,00 - mil reais – evento 1, DOC1, p. 11) não excede o limite de 60 (sessenta) salários mínimos, que na data de ingresso da demanda (17-2-2022), equivaliam a R$ 72.720,00. Logo, a competência para o julgamento do recurso é absoluta e inderrogável da Turma Recursal, a teor do que dispõe a legislação regente dos Juizados Especiais da Fazenda Pública e do que estabelecido nas diretrizes definidas pelo Grupo de Câmaras de Direito Público desta Corte de Justiça.
A propósito, destacam-se inúmeros precedentes das Turmas Recursais envolvendo matéria similar, a indicar o acolhimento da competência:
RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO CONDENATÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. MUNICÍPIO DE ERVAL VELHO. SERVIDOR PÚBLICO. HORAS EXTRAS. AVENTADA SUPRESSÃO DO INTERVALO INTRAJORNADA. TESE REFUTADA. VÍNCULO ESTATUTÁRIO. INAPLICABILIDADE DAS DISPOSIÇÕES DA CLT. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO NA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL DO INTERVALO RESPECTIVO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PRETENSÃO DE PERCEBIMENTO DA VERBA DE FORMA RETROATIVA. NÃO ACOLHIMENTO. VANTAGEM DEVIDA SOMENTE A PARTIR DA DATA DE CONFECÇÃO DO LAUDO PERICIAL. INSALUBRIDADE QUE NÃO SE PRESUME. POSICIONAMENTO ADOTADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA (TEMA 12 - PUIL 413/RS). SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, 420160 0301775-15.2017.8.24.0235, 1ª Turma Recursal, Relator para Acórdão JABER FARAH FILHO, D.E. 09/05/2024 -destaquei)
RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO DECLARATÓRIA E CONDENATÓRIA. PRETENSÃO DE RECEBIMENTO DE HORAS EXTRAS E SEUS REFLEXOS. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE RIO DO CAMPO. MOTORISTA DA SECRETARIA DE SAÚDE. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS. RECURSO DO ENTE MUNICIPAL RÉU. TESE DE NECESSIDADE DE EXCLUSÃO DO PERÍODO REFERENTE AO INTERVALO INTRAJORNADA DE 1H:30MIN POR DIA DE TRABALHO. INSUBSISTÊNCIA. PEDIDO CONTRAPOSTO NÃO EXPRESSAMENTE FORMULADO NA CONTESTAÇÃO. RUBRICA NÃO OBJETO DA LIDE. INOVAÇÃO RECURSAL. ADEMAIS, AUSENTE QUALQUER PROVA DE GOZO PELO SERVIDOR (ART. 373, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS (LEI N. 9.099/95, ART. 46). (TJSC, 420160 5001769-39.2021.8.24.0143, 2ª Turma Recursal, Relator para Acórdão AUGUSTO CESAR ALLET AGUIAR, julgado em 29/10/2024 - destaquei)
RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO, OCUPANTE DO CARGO DE MOTORISTA DE AMBULÂNCIA. HORAS-EXTRAS, INTERVALO INTRAJORNADA E ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO AUTOR. DISCUSSÃO QUANTO AO GRAU DA INSALUBRIDADE CONSTATADO EM PERÍCIA (20%). REJEIÇÃO. SITUAÇÃO FÁTICA ANALISADA EM PROFUNDIDADE. LAUDO PERICIAL CONSONANTE AO LTCAT ELABORADO PELO MUNICÍPIO. CONJECTURAS ABSTRATAS INSUFICIENTES PARA INFIRMAR A ANÁLISE TÉCNICA. INDENIZAÇÃO PELA SUPRESSÃO PARCIAL DE INTERVALO INTRAJORNADA. INSUBSISTÊNCIA. EMPREGADO QUE ESTAVA SUBMETIDO AO REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO. VÍNCULO ESTATUTÁRIO QUE EXCLUI PEDIDOS RELACIONADOS COM VERBAS TÍPICAS DA RELAÇÃO DE TRABALHO PRIVADA. AUSÊNCIA DE PROVA ACERCA DA PREVISÃO DE INTERVALO INTRAJORNADA NA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. AUTOR, ADEMAIS, QUE REALIZAVA PAUSAS PARA ALIMENTAÇÃO. HORAS-EXTRAS HABITUAIS NÃO INDENIZADAS. ACOLHIMENTO PARCIAL. VERSÃO AUTORAL CORROBORADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. MUNICÍPIO RÉU QUE DEIXOU DE TRAZER AOS AUTOS O REGISTRO DE PONTO DO SERVIDOR E NÃO JUSTIFICOU A IMPOSSIBILIDADE DE FAZÊ-LO. ÔNUS DA PROVA QUE LHE INCUMBIA. RECONHECIMENTO DO DIREITO. QUANTIFICAÇÃO CONFORME A PROVA RECOLHIDA NO FEITO E A PREVISÃO DO ART. 6º DA LEI N. 9.099/95. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, RCIJEF 5000646-98.2020.8.24.0059, 3ª Turma Recursal, Relatora para Acórdão BRIGITTE REMOR DE SOUZA MAY, julgado em 26/03/2025 - destaquei)
Por fim, vale ressaltar que a causa não se insere naquelas exceções previstas no art. 2º, § 1º, da Lei n. 12.153/2009, que excluem da competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública algumas matérias.
Pelo exposto, não conheço do recurso e, convertida a apelação em recurso inominado, determino o seu encaminhamento para a Turma Recursal competente.
Intimem-se.
assinado por JAIME RAMOS, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7080839v5 e do código CRC 2676c195.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JAIME RAMOS
Data e Hora: 13/11/2025, às 22:56:39
5003945-71.2022.8.24.0008 7080839 .V5
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:54:08.
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